segunda-feira, 14 de junho de 2010

FANTASMAS DO PASSADO

Alerta para que este texto não seja utilizado para justificar falhas por parte de pessoas que não querem se dar a conhecer como realmente são: Este texto não foi escrito para pessoas que mal se conhecem, que começaram a namorar recentemente ou que têm dúvida se cada uma é a pessoa certa para a outra. Este texto foi escrito para casais que têm certeza de que se amam e não apenas estão apaixonados.

Quando nós nascemos, talvez antes ainda, em algum momento... talvez a partir do instante em que somos concebidos, nos tornamos alvo das coisas que acontecem no mundo a nossa volta. O mundo muda e as mudanças repercutem sobre nós. A cada nova divisão celular somos influenciados por inúmeros fatos que acontecem em torno de nós. À medida em que nos desenvolvemos, somos afetados pelo ambiente. E ao longo de toda a nossa vida nosso organismo se desenvolve como resultado de uma dança misteriosa que combina as tendências genéticas com os fatores ambientais. Nosso sistema nervoso é a parte de nosso corpo que mais precisamente registra esses fatos. Nossos sentidos se desenvolvem e se aperfeiçoam, e fornecem a nosso cérebro dados cada vez mais precisos. Em algum momento, talvez desde o início, nossas interações com as pessoas tornam-se a tônica de nossa vida. Se somos cuidados ou destratados, amados ou detestados, ou, pior, ignorados... tudo é registrado em nossas mentes. Com o tempo aprendemos a reagir: tocar, chorar, gritar, sorrir e, enfim, falar; e em nossas mentes também ficam gravadas nossas reações às ações de outras pessoas. Nosso mundo interno vai-se construindo com lembranças à medida que o tempo passa. As pessoas que tocam nossa vida deixam marcas muitas vezes indeléveis. Algumas muito boas, outras não tão boas, e outras muito ruins. Somos o centro de uma história: a história de cada um de nós. Nossos pais são as figuras próximas mais importantes nesse cenário. Amor e carinho fazem-nos guardas lembranças felizes; ofensas e humilhações inundam nossa mente de dor. Tudo fica registrado. E nós crescemos, e nos desenvolvemos, e carregamos conosco essa história. Nela, pessoas importantes para nós desempenham papéis: irmãos, tios, primos, conhecidos, amigos e inimigos... Nosso cérebro registra as interações com cada um deles. Assim se constrói nossa história com seus diversos personagens. Dentre esses personagens, alguns nos encantam e suas lembranças nos despertam sentimentos agradáveis. Outros nos são indiferentes. Outros ainda nos despertam sentimentos ruins e suas lembranças nos assombram como visões de fantasmas. Essa história e seus personagens é carregada conosco para onde quer que vamos, passa a fazer parte de nós. À medida em que conhecemos novas pessoas, nelas vislumbramos traços, semelhanças com os personagens de nosso passado mais remoto. Quando encontramos o amor, nenhum dos parceiros chega sozinho. Cada um carrega consigo sua história com todos os seus personagens, e com eles os ecos de nosso passado. E ao longo da convivência vamos percebendo também no ser amado semelhanças com os personagens de nossa história: alguns bons, alguns maus. Em momentos de encantamento, identificamos na pessoa amada características positivas desses personagens. Mas quando surgem os desentendimentos, gestos e palavras da pessoa amada podem despertar em nós fantasmas há muito adormecidos. Uma mentira evoca em nós as lembranças de tantas vezes em que já fomos enganados; uma palavra rude pode evocar lembranças de diversos momentos em que fomos agredidos. Assim, uma pequena falha da pessoa amada pode evocar a lembrança de inúmeras falhas de pessoas que já passaram por nossa vida, ou até mesmo de falhas de pessoas de quem apenas ouvimos falar. Isso pode virar uma bola de neve quando a um pequeno erro da pessoa amada somamos as lembranças de erros semelhantes que foram cometidos contra nós e as lembranças de outros erros do mesmo tipo sobre os quais lemos ou apenas ouvimos falar. Assim, uma pluma de pecado pode acabar pesando uma tonelada quando projetamos na pessoa amada os fantasmas de nossa história de vida. Nesse caso podemos ver em um parceiro bem intencionado um monstro inspirado nas projeções dos fantasmas de nosso passado. Precisamos ter cuidado com essas situações. Uma palavra atravessada do outro pode evocar a dor e a raiva de todas as agressões sofridas no passado. Para exorcizar os fantasmas do passado muitas vezes é necessária psicoterapia. No dia a dia, um pedido de desculpas da parte de um, um pouco de compreensão da parte do outro, uma boa dose de amor de ambas as partes e um diálogo esclarecedor podem desfazer os mal-entendidos, aliviar o sofrimento e fazer passar a dor.

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